Folha de São Paulo – Inflação elevada muda hábitos no supermercado

TONI SCIARRETTA
CLAUDIA ROLLI
DE SÃO PAULO

Com o bolso mais apertado e menos confiante na economia, o consumidor voltou a fazer compras do mês, a se deslocar mais para economizar e a buscar nas prateleiras dos supermercados mais baratos uma forma de se proteger da inflação.

Pesquisa da consultoria CVA Solutions com 6.985 consumidores de todo o país mostra um avanço dos supermercados mais populares e do atacarejo (que vende em quantidades maiores e a preços menores) na preferência dos clientes, em detrimento de benefícios como variedade de produtos e da qualidade no atendimento.

O estudo foi realizado em agosto, quando a inflação acumulada em 12 meses pelo IPCA foi 6,07%. Na ocasião, os consumidores avaliaram 65 redes varejistas de todas as regiões do país.

Foram considerados três itens relacionados a custos (preço, promoções e facilidade de pagamento) e dez referentes a benefícios (inclui desde reputação da loja, atendimento, variedade e qualidade de produtos até tempo na fila, estacionamento e proximidade).

“Os supermercados mais bem avaliados focaram em preço, promoções e parcelamento. Atacadão e Assaí se destacaram porque a grande referência deles para o consumidor é o preço”, diz Sandro Cimati, sócio da consultoria CVA Solutions, empresa de pesquisa de mercado.

Entre os supermercados, o Dia e o Walmart também tiveram desempenho favorável com estratégias de preço baixo, segundo a pesquisa.

Quatro em cada dez entrevistados têm renda familiar na faixa entre R$ 2.035 e R$ 6.780 mensais.

No estudo anterior, as redes regionais (de menor porte e alcance mais restrito a municípios ou bairros) conseguiram desbancar os gigantes do varejo ao se destacarem na preferência dos clientes na forma de atendimento, na qualidade do serviço oferecido e até mesmo no tempo gasto para se deslocar.

“Os benefícios ganharam mais destaque no passado. Agora, o peso do custo avançou. O comportamento é de quem quer proteger o poder de compra”, disse Cimati.

Em 2011, os itens relacionados ao custo tinham 60% de peso na decisão de onde comprar, enquanto os benefícios respondiam pelos 40% restantes. Neste ano, o custo respondia por 63% da decisão, e os benefícios, 37%.

PEQUENOS LUXOS

Luciana Salazar, 40, dona de um comércio em São Caetano do Sul (ABC paulista), diz que prefere “dividir” as idas ao supermercado para equilibrar o orçamento.

“Bebidas, leite e produtos de limpeza prefiro comprar no atacado quando faço a compra do mês. Nas idas semanais aos supermercados, compro legumes, frutas e escolho também o que está em promoção”, disse.

A falta de variedade nas prateleiras e a menor qualidade do atendimento do atacarejo são compensadas, segundo a comerciante, com os preços menores.

Compras pequenas e de última hora, como comida pronta, petiscos e frios são feitas nos supermercados da vizinhança.

Para manter o padrão de consumo e não abrir mão de seus “pequenos luxos”, a professora Ana Maria Silva, 37, diz que prefere economizar comprando em supermercados “menos badalados”.

“Fujo dos que estão dentro de shoppings e em bairros nobres. Mesmo que tenha de encarar uma fila um pouco maior, compensa economizar para manter outros luxos, como um chocolate importado ou um vinho de qualidade.”

Mais da metade dos consumidores compra marca própria no supermecado

TONI SCIARRETTA
CLAUDIA ROLLI

DE SÃO PAULO

Não são apenas conservas e produtos de limpeza e higiene que o consumidor está estocando quando encontra preço baixo.

Até iogurte entra na lista de compras da dona de casa Priscila Lopes, 32, quando opta por encher o carrinho nos atacarejos.

“Como o consumo de iogurte é grande por causa das crianças, aproveito para comprar em quantidade quando o preço é vantajoso. Também levo produtos de marca própria para economizar.”

Mais da metade dos entrevistados (52%) afirmou comprar produtos de marca própria dos supermercados, segundo a pesquisa. Normalmente, são produtos similares aos tradicionais, mas com preços menores do que as marcas líderes de mercado, que investem em publicidade.

“Com endividamento elevado, receio de desemprego e inflação, o consumidor vai buscar preço mais baixo, seja na substituição de marcas mais caras por próprias, seja na diminuição das idas às compras”, diz o professor Nuno Fouto, coordenador de estudos do Provar (Programa de Administração de Varejo) da USP.

Nos supermercados, o investimento em marca própria cresceu tanto que há segmentos diferenciados.

o Pão de Açúcar, a marca Taeq embala produtos premium, orgânicos e saudáveis, que têm preço superior aos similares tradicionais. A marca Casino é usada para importados vindos da França.